
Nos últimos anos, Angola tem assistido a uma transformação silenciosa, mas profunda, no seu sistema eleitoral. As sucessivas alterações à Lei Eleitoral, impulsionadas pelo Executivo e sustentadas pela maioria parlamentar do MPLA, têm concentrado cada vez mais poderes nas mãos da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), afastando progressivamente as estruturas locais do processo de apuramento dos resultados.
O jornalista angolano Reginaldo Silva traça uma cronologia reveladora dessas mudanças, mostrando como a descentralização do apuramento foi sendo desmantelada ao longo do tempo:
2005 – A Lei Eleitoral em vigor na época previa uma participação mais ampla das estruturas eleitorais. A CNE era responsável pela centralização dos resultados finais, mas os círculos eleitorais tinham papel relevante no apuramento.
2011 – Uma nova lei aprovada por consenso previa que os resultados gerais provisórios seriam centralizados pela CNE com base nas informações das Comissões Provinciais. No entanto, o apuramento provincial nunca chegou a ser implementado efetivamente.
2021 – A Lei n.º 30/21 eliminou completamente as fases de apuramento municipal e provincial. A CNE passou a receber diretamente os documentos das assembleias de voto, centralizando ainda mais o processo.
2025 – Em discussão está uma nova proposta que pretende eliminar a acta-síntese. O presidente da mesa n.º 1 apenas recolheria as actas das mesas e as enviaria à CNE, afastando de vez qualquer mediação por estruturas intermédias.
Segundo Reginaldo Silva, esta centralização excessiva compromete os consensos democráticos alcançados no passado e levanta sérias dúvidas sobre a transparência e a confiança no sistema eleitoral. O país caminha para um modelo onde uma única entidade concentra toda a responsabilidade do apuramento, num cenário que preocupa analistas e a sociedade civil.

Fonte: Club-K