
O ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente, isento de processos tanto em Angola quanto em Portugal, voltou a ser alvo da atenção internacional. De acordo com informações da Africa Intelligence, autoridades norte-americanas, em estreita coordenação com Luanda, analisam a possibilidade de aplicar sanções financeiras ao abrigo da Lei Magnitsky, que pune casos graves de corrupção e violações de direitos humanos.
Relação próxima com o poder
Manuel Vicente, de 69 anos, vive nos Emirados Árabes Unidos há quase uma década. Desde 2017, tem conseguido escapar da justiça, em grande parte devido à sua proximidade com o presidente João Lourenço. Antigo CEO da Sonangol (1999-2012) e vice-presidente de Angola (2012-2017), Vicente atuou como conselheiro informal do chefe de Estado para questões petrolíferas, sendo protegido politicamente e beneficiado pela imunidade judicial até 2022.
Essa proteção foi crucial para que evitasse, por exemplo, o julgamento em Portugal em 2018, relacionado a casos de corrupção, que acabou transformado em crise diplomática entre Lisboa e Luanda.
Pressão externa e cálculo político
Com a possibilidade de um terceiro mandato de João Lourenço em debate, Washington foi acionado pelo próprio presidente angolano, que teme a influência de Vicente como potencial opositor com recursos financeiros no exterior.
Segundo a Africa Intelligence, o tema foi discutido entre Luanda e Noah Zaring, encarregado de negócios dos EUA em Angola. O então presidente Donald Trump deu sinal verde para que o Tesouro e o Departamento de Estado investigassem o caso. Para Washington, a cooperação com Angola é estratégica, sobretudo no contexto do Corredor do Lobito, projeto ferroviário de 1.700 km que liga Angola ao sudeste da RDC, vital para o escoamento de minerais africanos para o Ocidente.
Documento de pressão
Em 2020, a ONG Transparência Internacional e o grupo Amigos de Angola, liderado por Florindo Chivucute, enviaram ao Departamento de Estado norte-americano um documento de 38 páginas detalhando acusações contra Vicente, incluindo corrupção, lavagem de dinheiro e desvio de fundos públicos. O texto, ao qual a Africa Intelligence teve acesso, também cita os generais Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa” e Leopoldino Fragoso do Nascimento “Dino”, além de mencionar a empresária Isabel dos Santos.
Atualmente, Dino e Kopelipa enfrentam julgamento em Luanda, acusados de desviar centenas de milhões de dólares destinados à reconstrução pós-guerra. Vicente, embora citado mais de 30 vezes na acusação, não figura como réu.
Arma diplomática
Para Washington, a Lei Magnitsky não é apenas uma ferramenta de combate à corrupção, mas também um instrumento diplomático. O recente uso da medida contra o juiz brasileiro Alexandre de Moraes, em julho, mostra que os EUA estão dispostos a utilizá-la em situações de interesse político.
No caso angolano, documentos como os Luanda Leaks e a carta da Transparência Internacional fortalecem a possibilidade de que Manuel Vicente se torne alvo direto de sanções internacionais, em um movimento que pode redesenhar o equilíbrio político e econômico em torno do poder em Angola.
Fonte: Africa Intelligence